ACADEMIA

sexta-feira, 22 de junho de 2018

Copa 2018: por que seleções menores surpreendem na abertura do Mundial


O gol da Suíça surgiu de escanteio em que Miranda não subiu, Alisson não saiu, e a Seleção Brasileira abriu brecha para que o adversário empatasse. 1 a 1. Apesar da frustração para um país que raramente começa uma Copa sem os três pontos, essa foi a regra para outros grandes. A Inglaterra só saiu com a vitória por 2 a 1 sobre a Tunísia porque, também de um escanteio, a bola rebateu e sobrou para a cabeça do furacão Harry Kane. Com um gol de falta de Cristiano Ronaldo no último minuto, Portugal empatou com a Espanha. Dos 38 gols marcados nas partidas de abertura da Copa do Mundo de 2018, 22 foram feitos assim, oriundos da bola parada. Esse é o sintoma mais claro de um novo futebol. Escanteios, cobranças de falta e pênaltis são os principais recursos para seleções que hoje encontram adversários fechadíssimos em suas defesas.
Mais do que palco para jogadas individuais estonteantes, o futebol moderno é um jogo de preenchimento de espaços e de execução disciplinada de ideias. A Copa provê exemplos. Mesmo equipes menos tradicionais apresentaram desempenhos nocivos às favoritas — versão moderna daquele velho clichê: “Não existe mais bobo no futebol”. A Islândia tirou pontos da Argentina ao empatar em 1 a 1. Um paredão gelado postado à frente da área fez com que os islandeses anulassem magistralmente o gênio Messi. A Suíça se fechou na defesa e atrapalhou ataques do Brasil pela esquerda — lado em que triangulam Marcelo, Neymar e Philippe Coutinho, esse último autor do gol brasileiro. E o México fez um jogo histórico. O time treinado por Juan Carlos Osorio resistiu bravamente e venceu a Alemanha por 1 a 0 num contra-ataque fulminante.
Um pouco de tatiquês vai bem para entender o que está havendo nos campos russos. A postura defensiva aguerrida dessas seleções ajuda a entender por que craques de quem se espera muito, como Messi e Neymar, não se apresentaram bem na primeira rodada. As defesas geralmente se posicionam em duas linha de quatro (uma de defensores, uma de meios-campistas) ou em uma linha de cinco defensores protegida por três meias. Elas compõem esquemas famosos, como o 4-4-2 e o 5-3-2. Esquemas que existem há décadas, mas que hoje são executados com uma diferença importante: os jogadores dessas linhas defensivas jogam tão próximos uns dos outros que não deixam mais espaços para atacantes adversários. É aí que Messi e Neymar se dão mal. O argentino gosta de jogar entre as duas linhas (posição que ficou conhecida como falso nove), enquanto o brasileiro curte partir da esquerda para o centro em diagonal, no drible, para finalizar. Nenhum deles achou espaço para jogar diante de seleções pequenas, mas modernas, como Islândia e Suíça.
Se ainda não ficou perfeitamente claro, um jeito de entender o que está acontecendo no futebol da Copa de 2018 é olhar para o handebol. Esse tipo de confronto é comum na modalidade em que se faz gols com as mãos. As defesas fazem paredes na frente da área, em esquemas como o 6-0, e forçam ataques adversários a girar a bola de um lado para o outro atrás de espaços para driblar e finalizar. “A ideia é ter mais gente no setor onde está à bola para evitar os confrontos um contra um”, resumiu Álvaro Casagrande, supervisor da Seleção Brasileira feminina e técnico do São Bernardo, consultado por ÉPOCA para comparar os jogos táticos do futebol e do handebol. Quando um defensor no handebol rouba a bola do atacante adversário, ele parte em velocidade para o outro lado da quadra e tenta marcar enquanto a defesa rival se organiza. A diferença está nas dimensões da quadra e do campo e no dinamismo do jogo. Mas o conceito é o mesmo. Ele explica como o México conseguiu segurar a Alemanha, contra-atacar e ganhar.
O posicionamento minucioso foi importado por seleções do mundo todo e tornou a Copa de 2018 a mais tática de todos os tempos. Tirando uma Arábia Saudita aqui e um Panamá ali, as seleções estão niveladas física e taticamente por cima. Em que outro momento Islândia, Suíça e México foram tão bem — concomitantemente com aparições medíocres de Argentina, Brasil e Alemanha? Isso porque quase todo mundo aprendeu a fazer uma boa retranca. Meses antes da Copa, Xavi fez essa avaliação quase profética do que veríamos nos campos russos. Disse ele que o futebol atual tem muito mais Simeones do que Guardiolas. Além do ex-técnico do Barça, a referência é ao argentino Diego Simeone, que à frente do Atlético de Madrid preparou o antídoto a essa estratégia, um ferrolho defensivo combinado a contra-ataques rápidos e letais. Foi o contraponto entre essas duas escolas a grande marca deste início de Copa na Rússia. Com vantagem, até aqui, para quem soube aplicar a ideia de jogar atrás e vencer no detalhe.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.