ACADEMIA

sexta-feira, 20 de abril de 2018

Personagem da semana: Aécio Neves


ÉPOCA
Com os cabelos mais brancos, a fisionomia abatida e o corpo acima do peso num terno apertado, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), de 58 anos, fez uma passagem-relâmpago pelo Senado no fim da tarde da terça-feira 17 de abril. Menos de uma hora antes, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão unânime, tornara-o réu em denúncia de corrupção passiva e obstrução da Justiça. É consequência da gravação de uma conversa, no hotel Unique em São Paulo, no dia 24 de março de 2017, em que ele pediu R$ 2 milhões ao empresário Joesley Batista, da JBS.
Diferentemente de 2014, quando perdeu uma disputada eleição presidencial para Dilma Rousseff e arrastava atrás de si um séquito de políticos, Aécio desta vez andava sozinho, na presença de poucos auxiliares de sua equipe. Ele deu uma passada rápida no plenário do Senado para manter conversas ao pé do ouvido com correligionários. E saiu pouco tempo depois, a fim de encarar — praticamente sozinho — a imprensa que o aguardava do lado de fora. Os costumeiros papagaios de pirata do PSDB e de legendas aliadas, sempre a postos para fazer figuração em frente às câmeras na época em que ele pregava pelo impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, desta vez bateram asas. Não quiseram associar suas imagens à do único senador tucano réu no Supremo.
Aécio não respondeu a perguntas dos jornalistas. Com olhos fixos à frente, foram cerca de três minutos de um pronunciamento entremeado com sorriso sem graça para declarar que já esperava por aquela decisão da Suprema Corte e que estava “sereno” para, finalmente, começar seu processo de defesa na Justiça. Aécio cogitou fazer um discurso na tribuna do Senado. Mas não se encorajou. “O plenário está vazio...”, disse ao justificar sua desistência em assumir a tribuna. E bateu em retirada para sua casa, uma mansão no bairro do Lago Sul, em Brasília, onde mora com a mulher e o casal de filhos gêmeos desde que a delação da JBS se tornou pública. Deixar de viver no Rio de Janeiro, em seu apartamento na Avenida Vieira Souto, em Ipanema, foi um dos primeiros movimentos do tucano para tentar restaurar os destroços nos quais sua vida pública se transformou.
A gravação de Joesley, seguida por uma operação da Polícia Federal que flagrou emissários do senador recebendo uma parcela de R$ 500 mil, em dinheiro vivo, foi o maior baque da carreira política de Aécio. Sepultou suas pretensões de continuar a ser protagonista na política nacional. Até então, Aécio ainda dava as cartas como presidente do PSDB e como interlocutor preferencial do presidente Michel Temer entre os tucanos desde o impeachment de Dilma. Mantinha-se influente, apesar de outras denúncias, como a construção com dinheiro público de um aeroporto para uso privado em terras de parentes, em Cláudio, no interior de Minas Gerais. Também foi delatado por executivos da Odebrecht que denunciaram cobrança de propinas na construção da Cidade Administrativa, em Belo Horizonte, e em obras do setor elétrico, além da emissão de notas frias de mais R$ 60 milhões repassados para sua campanha presidencial. Todas essas suspeitas geraram contra Aécio, além da ação penal em que ele se tornou réu, mais oito investigações que correm sob o comando do Supremo. Ele nega todas as acusações.
Quando as denúncias começaram a pipocar, aliados e tucanos da cúpula do partido aconselharam Aécio a se recolher. Ele não ouviu. Quis continuar dando ordens no partido que presidia. Também alardeava seus encontros com Temer, colocando-se como a ponte entre o chefe do Executivo e a bancada tucana no Congresso Nacional, que ele procurava manter sob controle. Apostou ser essa uma maneira de continuar a exibir prestígio a prefeitos e lideranças regionais em Minas Gerais e assim contornar a derrota que sofrera em seu estado em 2014. Embora tenha deixado o governo mineiro em 2010 com 70% de aprovação e emplacado um sucessor no Palácio da Liberdade, Aécio perdeu a eleição em Minas Gerais para Dilma — derrota crucial para o resultado final. De quebra, o PT ainda elegeu Fernando Pimentel como governador. Após a delação de Joesley, a estratégia de Aécio naufragou — e ele perdeu o comando do partido para o ex-governador Geraldo Alckmin, embora tenha tido força para afastar um adversário, o senador Tasso Jereissati (CE), da presidência interina do partido, depois que ele se licenciou do cargo.
Agora que se tornou réu, a primeira missão de Aécio é tentar manter-se em liberdade. Para isso, solicitou à equipe de seu advogado, o criminalista Alberto Toron, acesso a todas as peças acusatórias, mantém-se informado sobre os andamentos dos inquéritos e tem estudado casos similares ao seu que tramitam no STF. De corpo presente ou por telefone, tem participado também de reuniões com os advogados para definir estratégias de defesa.
Com discrição, Aécio iniciou também uma tentativa de reabilitação de sua imagem pública, focada em Minas Gerais. No Senado, optou por atuação circunspecta. Passou a apresentar projetos e emendas ligados, sobretudo, à proteção da criança e do adolescente. Semanalmente, concede pelo menos três entrevistas para rádios do interior de Minas Gerais, nas quais faz sua defesa pessoal e relembra o legado de sua gestão de oito anos no governo de Minas Gerais. Neste ano, participou também de ao menos cinco encontros com prefeitos no estado que fazem oposição ou estão descontentes com o governo de Fernando Pimentel. Desse modo, ele trabalha para se aproximar de lideranças regionais a fim de tentar garantir apoio na eleição deste ano, embora ainda não saiba a qual cargo concorrerá. Não tem andado, porém, pelas ruas para conversar com eleitores, como consta na cartilha básica de qualquer candidato. Teme hostilidades.
Oficialmente, Aécio está fazendo esses movimentos com o objetivo de construir alianças para apoiar a candidatura do senador tucano Antonio Anastasia ao governo de Minas Gerais, um dos pilares da campanha presidencial do ex-governador Geraldo Alckmin. As opiniões sobre o futuro de Aécio dentro do PSDB, porém, se dividem. Os mais fiéis acham que ele tem de tentar renovar o mandato de senador, que se encerra neste ano. Os realistas esperam que ele busque uma eleição mais fácil para uma vaga na Câmara dos Deputados. Assim, manteria seu foro privilegiado e, com sorte, ainda puxaria votos para outros candidatos da coligação. Os mais pragmáticos acham que Aécio se tornou tão radioativo que será contagioso dividir qualquer palanque com ele em Minas Gerais. “O ideal é que Aécio não seja candidato”, disse Alckmin, um dia depois de o mineiro virar réu.

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